O entrevistado dessa edição é o neurocirurgião paraibano, Ronald Farias, que comemora 25 anos de atividades profissionais após concluir a residência médica em Neurocirurgia no Hospital dos Servidores do Estado de São Paulo, em 1997. Além de atuar como neurocirurgião, Ronald também se dedica às atividades associativas de classe. Atualmente é o presidente da Associação Médica da Paraíba (AMPB) e, recentemente, foi presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia (SBN). Em seu consultório da Clínica da Coluna, na Torre, ele nos recebeu para um bate-papo, onde revelou fatos e histórias surpreendentes nesses 25 anos de carreira.
Como surgiu seu interesse pela Medicina?
RF – No ensino médio, eu gostava de informática e pretendia fazer vestibular para ciências da computação e economia. Entretanto, no último ano do colegial, recebi forte influência de um tio materno – Dr. Periguari, neurocirurgião em São Luis/MA – e decidi prestar vestibular para medicina na UFPB. Embora no início do curso médico adotasse um pensamento puramente matemático e cartesiano, com o passar do tempo fui conhecendo o lado humanístico da medicina, o cuidado com as pessoas e a dedicação aos pacientes, o que muito me encantou. Mas foi importante esse conhecimento matemático para elaborar modelos e algoritmos mentais para fazer o diagnóstico preciso das patologias.
A Residência em Neurocirurgia é considerada uma das mais longas e desafiadoras. Como foi a escolha dessa especialidade e como foi esse período em sua formação profissional?
RF- É incrível o fascínio que o cérebro e os seus “mistérios” exercem nos estudantes de medicina. Tão logo comecei a estudar anatomia e fisiologia do sistema nervoso, fiquei encantado pela neurocirurgia. Quando conclui a graduação, fui aprovado na concorrida Residência de Neurocirurgia do Hospital dos Servidores do Estado de São Paulo (HSPE), considerada uma das melhores do país. Foram anos de muita dedicação e aprendizado: o dia-a-dia da residência médica era tão puxado que certa vez passei 72 horas trabalhando ininterruptamente, com, no máximo, duas horas diárias de sono, entrando em cirurgias e atendendo pacientes. A recompensa foi a oportunidade de ter contato com grandes nomes da neurocirurgia brasileira, que “pegaram na minha mão” e me ensinaram esse maravilhoso ofício. Quando acabei a residência, decidi fazer estágios complementares (“fellowships”) em subespecialidades da neurocirurgia, como cirurgia da coluna vertebral, tratamento da dor, cirurgia vascular cerebral e cirurgia da base do crânio, em São Paulo e em Nova York/EUA.
Como foi o início de sua carreira profissional? Não teve interesse em permanecer em São Paulo?
RF – Optei por retornar a João Pessoa sabendo que a cidade que sempre me apoiou precisava de profissionais qualificados para o desenvolvimento da medicina. Sempre acreditei que poderia ser mais útil em minha cidade. Aqui, iniciei minhas atividades profissionais no ano de 2019, como Diretor Clínico do antigo Hospital de Pronto-Socorro Municipal (onde hoje se localiza a Secretaria Municipal de Saúde). Na época, não havia neurocirurgia naquele hospital. Resolvi, junto com o meu colega neurocirurgião, Dr. Valdir Delmiro, e com o apoio da Secretaria Municipal de Saúde, iniciar um projeto de serviço próprio de neurocirurgia do Município. Realizamos, na ocasião, cerca de 80 cirurgias neurológicas, necessárias para solicitar o credenciamento em alta complexidade junto ao Ministério da Saúde. Atualmente, esse Serviço está localizado no Hospital Santa Isabel. Interessante é que, naquela época, operávamos de tudo na neurocirurgia, inclusive casos complexos, como a primeira clipagem de aneurisma da artéria basilar, considerada a cirurgia mais desafiadora da neurocirurgia. Dois anos depois, fundamos, com outros neurocirurgiões da cidade, o Serviço de Neurocirurgia do Hospital de Trauma, onde ocupei o cargo de Diretor e permaneci trabalhando por cerca de 10 anos. Durante esse período, de forma voluntária e não remunerada, também trabalhei no setor de cirurgias eletivas do Hospital e tive a grandiosa experiência de operar mais de 800 pacientes, o que para mim foi muito gratificante por ter podido ajudar essa enorme quantidade de pessoas e famílias necessitadas.
Obviamente, o senhor já deve ter operado inúmeros pacientes. Consegue recordar alguns casos que foram marcantes em sua carreira?
RF- Foram mais de 10 mil pacientes operados nesses anos todos. Alguns casos marcaram, sim, a minha carreira, principalmente as primeiras cirurgias de escoliose feita na Paraíba. Entretanto um caso foi bem emblemático: uma paciente gestante de quase nove meses, que apresentou uma hemorragia cerebral causada por um aneurisma cerebral gigante. No mesmo ato cirúrgico, operamos o aneurisma enquanto a equipe da obstetrícia fazia o parto cesariano, dando à luz um menino forte e bonito. A mãe saiu muito bem da cirurgia e, sabendo que eu não tinha filhos na época, ofereceu o filho recém-nascido para que eu o adotasse. Obviamente, não poderia aceitar tal oferta, mas aquele gesto me comoveu muito e me encheu os olhos de lagrimas. De um modo geral, os pacientes são muito agradecidos aos médicos. Isso é muito interessante na medicina. Já recebi convites para ser padrinho de filhos de pacientes, inclusive tem um filho de um paciente com o nome de Ronald, em minha homenagem.
Como a Neurocirurgia evoluiu nesses 25 anos?
RF- A neurocirurgia teve uma evolução fantástica nesses anos. E as cirurgias passaram a ser mais rápidas, menos invasivas e com melhores resultados. Destaco a simplicidade atual da cirurgia de hérnia de disco, cujos pacientes se operam com incisões mínimas, apenas com anestesia regional e recebem alta no mesmo dia. Antigamente, eram cirurgias complexas e que provocavam um certo temor na população. A técnica de vertebroplastia – para correção percutânea de fraturas vertebrais -, da qual me orgulho em ter sido o pioneiro entre os cirurgiões brasileiros, foi também um grande avanço. Na Cirurgia craniana, destaco, também, a embolização de aneurismas e a radiocirurgia para tumores cerebrais.
A neurocirurgia paraibana está acompanhado essa evolução?
RF- Vale destacar para a população paraibana que a neurocirurgia do nosso estado sempre esteve na vanguarda, acompanhando todo o processo evolutivo da especialidade e sendo referência nacional. Aqui, temos vários profissionais de destaque nas mais diversas subespecialidades da neurocirurgia.
Qual a mensagem que o senhor diria para os estudantes de medicina que pensam em fazer neurocirurgia?
RF- A neurocirurgia é uma especialidade fascinante que encanta muito os estudantes de medicina. Porém requer muitos anos de formação – em média seis anos -, além de muito esforço e dedicação. E não para por aí: sempre requerendo educação e treinamento continuados, ou seja, um vida de muito sacrifício pessoal e de renúncias. Então, pensem nesse cenário na hora de tomar a decisão pela escolha da especialidade.
Dr. Ronald Farias
Neurocirurgião
CRM/PB 4263 | RQE 2068